Refugiados ambientais e políticas públicas: Obstáculos e desafios decorrentes das mudanças climáticas[1]

Environmental refugees and public policies: Obstacles and challenges arising from climate change

Jeferson Teodorovicz[2] y Andréa Mendes Mascarenhas[3]

 

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Resumo

O presente artigo explora a trajetória da migração desde suas origens até a atualidade, abordando o refúgio e, em particular, o fenômeno do refúgio climático. O objetivo central é analisar políticas públicas relacionadas ao acolhimento e adaptação de refugiados ambientais. A metodologia empregada inclui pesquisa bibliográfica, revisão de literatura investigando o problema de como os Estados Acolhedores podem se preparar para receber adequadamente os Refugiados Ambientais sem comprometer sua própria estrutura econômica e social, seja preparando suas cidades para o impacto climático, seja preparando suas cidades para receber e integrar refugiados. Os resultados obtidos destacam a necessidade de políticas públicas adaptadas para lidar com essa questão emergente. As limitações do estudo incluem a falta de dados constantemente atualizados sobre os impactos econômico e social da migração climática, devido à grande quantidade, velocidade e intensidade em que tais fenômenos têm acontecido. As contribuições deste trabalho incluem exemplos de Políticas Públicas que tragam insights para o desenvolvimento de estratégias de mitigação e resiliência mais eficazes e sustentáveis, para um acolhimento bem-sucedido.

Palavras-chave: Refúgio, Migração Forçada, Políticas Públicas, Mudanças Climáticas, Refugiados Ambientais.

 

Abstract

This article explores the trajectory of migration from its origins to the present day, looking at refuge, and particularly the phenomenon of climate refuge. The main objective is to analyze public policies related to the reception and adaptation of environmental refugees. The methodology employed includes bibliographical research, a literature review investigating the problem of how host states can prepare to adequately receive environmental refugees without compromising their own economic and social structure, either by preparing their cities for the climate impact or by preparing their cities to receive and integrate refugees. The results highlight the need for adapted public policies to deal with this emerging issue. The study's limitations include the lack of constantly updated data on the economic and social impacts of climate migration, due to the sheer quantity, speed and intensity with which such phenomena have occurred. The contributions of this work include examples of Public Policies that provide insights for the development of more effective and sustainable mitigation and resilience strategies for successful reception.

Keywords: Refuge, Forced Migration, Public Policies, Climate Change, Environmental Refugees.

 

 

Introdução

Segundo dados da Organização Internacional para as Migrações (OIM), existem quase 300 milhões de migrantes internacionais no mundo (OIM, 2022), o que equivale a quase 4% da população global. Destes, mais de 100 milhões foram deslocados forçosamente, devido a perseguições, conflitos, violência, violações dos Direitos Humanos ou eventos que perturbaram a ordem pública (ACNUR, 2022). Só em 2021, mais de 30 milhões de deslocamentos aconteceram por desastres ambientais.

Embora seja uma realidade estabelecida no âmbito internacional, é evidente que ainda não existe um acordo internacional abrangente que regule as ações dos Estados em relação a todas as múltiplas dimensões da migração.

Essa falta de regulamentação se reflete na carência de mecanismos de proteção doméstica específicos ou, pelo menos, na ausência de mecanismos que permitam uma regularização da situação dos imigrantes. Como resultado, observa-se a tendência de tentar encaixar qualquer situação de migrante nos limitados instrumentos legais internacionais existentes, o que, por um lado, agrupa todos na mesma categoria e, por outro, prejudica o desenvolvimento de novas formas de proteção, além de reduzir a eficácia das normas já existentes. Um exemplo típico envolve o cenário no qual indivíduos deixam seus países de origem por razões que não se enquadram no critério legal de refugiado, que é o fundado temor de perseguição. Essas pessoas procuram refúgio pois consideram a opção mais refinada no contexto da migração. E é neste contexto que se encaixam os refugiados ambientais.

A alteração climática assume a configuração de uma ameaça sem precedentes e crescente para as estruturas sociais humanas. O processo de aquecimento global já alcançou um acréscimo de cerca de 1 grau Celsius acima dos níveis pré-industriais (IPCC, 2018). Neste ritmo, é previsto que se alcance um aumento de 1,5 graus Celsius entre os anos de 2030 e 2050. O incremento nas temperaturas globais tem contribuído substancialmente para a incidência de eventos climáticos extremos, mais frequentes e intensos, em escala global, abarcando eventos como ondas de calor, períodos de seca, precipitações intensas, inundações e tempestades de grande magnitude (IPCC, 2018).    

Tais impactos possuem implicações documentadas sobre um vasto leque de resultados ligados ao desenvolvimento, abrangendo áreas como saúde, renda, segurança alimentar, fornecimento hídrico e segurança global da espécie humana. Aproximadamente 40% da população mundial, correspondendo a cerca de 3,5 bilhões de indivíduos, já habitam em localidades altamente vulneráveis aos efeitos da alteração climática (IDMC, 2023).

É crucial aceitar que os refugiados ambientais serão uma realidade cada vez mais comum, e que nenhuma cidade está imune a desastres ambientais. Portanto, é imperativo que todos os países e cidades adotem Políticas Públicas de mitigação, de modo a estarem preparados para tais desastres, e de resiliência, para se recuperarem rapidamente após esse tipo de evento. Além disso, os Estados Acolhedores devem receber os refugiados com planos para aproveitar seu potencial no mercado de trabalho e implementar políticas de habitação para ajudá-los a começar uma nova vida sem sobrecarregar os recursos locais.

Eis que este estudo tem como objetivo principal compreender os impactos das mudanças climáticas, tanto global quanto localmente, e explorar os desafios dos Estados Acolhedores em lidar com desastres ambientais cada vez mais frequentes, imprevisíveis e severos, especialmente para os refugiados ambientais. Para isso, serão abordadas as perspectivas das mudanças climáticas e seus efeitos em diferentes regiões, bem como dos obstáculos na implementação de políticas públicas eficazes de mitigação e resiliência.

 

1.      Proteção jurídica internacional para refugiados ambientais

As mudanças climáticas e desastres ambientais estão causando impactos significativos nas vidas de milhões de pessoas ao redor do mundo, obrigando muitas delas a abandonar suas residências e, em alguns casos, até cruzando fronteiras internacionais. Os efeitos prejudiciais desses eventos frequentemente destacam a capacidade limitada de uma comunidade afetada para se ajustar, revelando suas vulnerabilidades já existentes. Esses efeitos podem se manifestar de forma repentina ou ao longo do tempo, resultando em perdas humanas, materiais, econômicas ou ambientais (Banco Mundial, 2023).

Carolina de Abreu Batista Claro (2015), em sua dissertação de mestrado e tese de doutorado, explorou a questão dos refugiados ambientais. Em ambos os estudos, ela discute a variabilidade e incerteza nas estimativas sobre a quantidade de refugiados ambientais no mundo e suas projeções para o futuro próximo. Essa incerteza é atribuída à dificuldade de quantificar os efeitos dos eventos ambientais na população. Esses efeitos influenciam as decisões de mobilidade e dificultam a precisão dos fatores que afetam os fluxos migratórios, considerando as causas ambientais como determinantes imediatos ou remotos da migração.

Os atuais mecanismos de governança internacional para migração e mudanças climáticas não estão adequadamente equipados para lidar com a questão dos refugiados ambientais. Segundo Claro (2015), a necessidade urgente de uma proteção jurídica internacional específica para esses refugiados, por si só, não é o suficiente. É crucial garantir que os refugiados ambientais tenham acesso à justiça nos países de acolhimento e que seus direitos sejam equiparados aos dos cidadãos locais, evitando qualquer forma de discriminação. Apesar de não estarem abrangidos pela Convenção da ONU sobre o Estatuto dos Refugiados (1951), o sistema jurídico atual, tanto em nível nacional quanto internacional, pode fornecer certas proteções e obrigações para esse grupo (Claro, 2015).

De acordo com Claro (2015), é fundamental reconhecer que o direito interno dos Estados, juntamente com os tratados internacionais aos quais estão vinculados, é aplicável aos refugiados ambientais, na medida do possível. Enquanto não houver um conjunto normativo específico para esses refugiados, é essencial que Estados, organizações internacionais, sociedade civil e organizações não governamentais trabalhem juntos para garantir a proteção dos direitos dessas pessoas, seja por meio de normas internacionais, princípios de direito ou legislação nacional existente.

A questão da proteção a ser concedida às pessoas deslocadas devido a fatores ambientais tem sido um tópico constante de discussão em nível internacional. A interligação entre as mudanças climáticas e os direitos humanos está sendo cada vez mais reconhecida no âmbito legal, tendo sido incluída, por exemplo, na decisão do Comitê de Direitos Humanos da ONU no caso Teitiota.

Em 2015, Ioane Teitiota buscou o Comitê de Direitos Humanos da ONU, afirmando que seu pedido de refúgio na Nova Zelândia fora negado. Acontece que o autor da ação alegou que os impactos das mudanças climáticas e da elevação do nível do mar o obrigaram a migrar da ilha de Tarawa, na República de Kiribati, para a Nova Zelândia. A situação em Tarawa tem se tornado cada vez mais instável e precária devido ao aumento do nível do mar causado pelo aquecimento global. A escassez de água doce decorre da contaminação por água salgada e da superlotação em Tarawa. As tentativas de lidar com a elevação do nível do mar tiveram resultados limitados. A terra habitável em Tarawa tem sido erodida, resultando em uma crise habitacional e em disputas de terras que levaram a várias fatalidades. Assim, Kiribati se tornou um ambiente insustentável e marcado pela violência para o autor e sua família (Sydney Appelation Tribunal, 2009).

O autor solicitou refúgio na Nova Zelândia, porém o Tribunal de Imigração e Proteção emitiu uma decisão desfavorável em relação ao seu pedido de asilo. No entanto, o Tribunal não descartou a possibilidade de que a degradação ambiental poderia "abrir caminhos para a Convenção de Refugiados ou jurisdição de proteção a pessoas" (Supreme Court of New Zeland, 2015). Tanto o Tribunal de Apelação quanto a Suprema Corte rejeitaram os recursos subsequentes do autor relacionados ao mesmo assunto.

No contexto específico do Sr. Teitiota, o Comitê de Direitos Humanos da ONU concluiu que, à época dos acontecimentos, os tribunais da Nova Zelândia não infringiram seu direito à vida. Isso ocorreu devido à avaliação detalhada e criteriosa de seu testemunho e outras informações disponíveis, que levaram à conclusão de que, apesar da situação grave em Kiribati, foram implementadas medidas de proteção adequadas. No entanto, essa decisão estabelece novos critérios que poderiam facilitar a validade de futuros pedidos de asilo relacionados às mudanças climáticas (UNHCR, 2020).

O Comitê também esclareceu que os requerentes de asilo não precisam demonstrar que enfrentariam perigo imediato ao retornar a seus países. O Comitê argumentou que os danos causados pelas mudanças climáticas podem surgir tanto de eventos repentinos (como tempestades intensas e enchentes) quanto de processos gradualmente desenvolvidos (como aumento do nível do mar, salinização e degradação do solo). Tanto eventos súbitos quanto processos mais lentos podem levar as pessoas a cruzarem fronteiras em busca de proteção contra os impactos das mudanças climáticas, conforme informações do Committee on Civil and Political Rights (CCPR) (UNHRC, 2019).

Além disso, o Comitê ressaltou o papel crucial que a comunidade internacional deve desempenhar em auxiliar os países afetados adversamente pelas mudanças climáticas. Ele afirmou que, sem esforços robustos a nível nacional e internacional, os efeitos das mudanças climáticas nos países de origem podem acionar as obrigações de não-devolução dos países receptores. Dado o extremo risco de um país inteiro ser submerso, as condições de vida nesse país podem se tornar incompatíveis com o direito à vida com dignidade, antes que esse risco se materialize (Hartwig, 2021).

Essa decisão representa o primeiro veredito de um órgão de tratados de direitos humanos da ONU sobre uma reclamação individual buscando proteção de asilo devido aos efeitos das mudanças climáticas.

Os impactos negativos das mudanças climáticas e dos desastres têm diversas repercussões para os Estados e às sociedades, assim como para o bem-estar e a garantia dos direitos individuais. Tais consequências podem incluir a prevalência e o aumento, disseminação e gravidade de doenças novas e recorrentes; insegurança alimentar e escassez de alimentos; gradativa diminuição de terras habitáveis e de água potável; exposição à exploração e ao tráfico; assim como a perdas humanas, materiais, econômicas ou ambientais, incluindo renda, habitações, meios de subsistência e, até mesmo, vidas.

Os efeitos adversos das mudanças climáticas e desastres muitas vezes são agravados por outros fatores, como governança deficiente, que mina a ordem pública, recursos naturais escassos, ecossistemas frágeis, mudanças demográficas, desigualdade socioeconômica, xenofobia e tensões políticas e religiosas, que, em alguns casos, culminam em violência. Como resultado desses impactos negativos das mudanças climáticas e desastres, somados a vulnerabilidades sociais, indivíduos podem se ver obrigados a deixar seus países e buscar proteção internacional (Banco Mundial, 2021).

A avaliação de solicitações de proteção internacional feitas no contexto dos impactos negativos das mudanças climáticas e desastres não deve se concentrar exclusivamente nos eventos climáticos ou desastres como ameaças naturais únicas ou principais. Um foco tão estreito pode não reconhecer adequadamente as características sociais e políticas das consequências das mudanças climáticas, nem os impactos dos desastres ou sua interação com outros motivos de deslocamento. De forma mais ampla, as mudanças climáticas e os desastres podem acarretar efeitos adversos significativos nas estruturas estatais e sociais, no bem-estar individual e no desfrute dos direitos humanos.

Se uma visão limitada for adotada em relação aos efeitos das mudanças climáticas e desastres, há o risco de que os tomadores de decisão concluam que o direito de refúgio não se aplica, e neguem o acesso ao processo de Determinação do Status de Refugiado (RSD, da sigla em inglês). Os desafios na avaliação de solicitações de proteção internacional, nesse contexto, decorrem de uma compreensão restrita dos impactos das mudanças climáticas e desastres, assim como da complexidade em aplicar definições de refugiado, seja o Artigo 1A da Convenção de 1951 ou na Declaração de Cartagena, de 1984.

As mudanças climáticas e os desastres podem impactar a realização dos direitos humanos devido à exposição e vulnerabilidade das pessoas aos seus efeitos, assim como à capacidade, habilidade e vontade do Estado em fornecer proteção. Essas situações podem restringir o acesso e controle sobre terras, recursos naturais, meios de subsistência, direitos individuais, liberdades e vidas, o que pode colocar em risco, entre outros: a realização do direito à vida; a integridade física; o padrão de vida adequado; saúde, água e saneamento; bem como a autodeterminação e o desenvolvimento. As populações podem sofrer impactos de maneira gradual ou imediatamente, ou enfrentar reduções a longo prazo no exercício de seus direitos humanos. Tanto a curto quanto a longo prazo, as populações afetadas podem estar sujeitas a riscos de violações de direitos humanos que se enquadram no conceito de perseguição conforme definido na Convenção de 1951.

As mudanças climáticas e os desastres frequentemente terão um impacto abrangente em comunidades inteiras. O fato de muitos ou todos os membros de uma comunidade serem afetados não deslegitima a validade do pedido individual de cada membro. Uma pessoa que busca o status de refugiado não precisa demonstrar um risco de perseguição maior do que o enfrentado por outros na mesma situação. O critério reside na fundamentação do medo de ser perseguido por parte de um indivíduo. Em algumas situações, os efeitos negativos das mudanças climáticas e dos desastres em uma comunidade como um todo podem reforçar, em vez de enfraquecer, as evidências que justificam o temor individual de perseguição.

No contexto dos impactos negativos das mudanças climáticas e dos desastres, um medo fundamentado de ser perseguido pode surgir especialmente entre pessoas que já estão marginalizadas ou vulneráveis. Dependendo das condições políticas, religiosas e socioeconômicas locais, mulheres, crianças, idosos e pessoas com deficiência - que possuem fragilidades inatas -, grupos minoritários, povos indígenas e indivíduos que vivem em áreas rurais e dependem de recursos naturais para sustento, estarão particularmente em risco. Um medo fundamentado de perseguição também pode ocorrer entre defensores do meio ambiente, ativistas ou jornalistas, que são alvos por defender, conservar e reportar sobre ecossistemas e recursos.

Os efeitos prejudiciais das mudanças climáticas, como degradação ambiental, por exemplo, podem resultar em pressões sociais, econômicas ou políticas. Além disso, na fase de redução de riscos/preparação, antes de um desastre ocorrer, ou no período posterior a um desastre, certas populações podem ser excluídas, afetando algumas de forma desproporcional. Como consequência, membros dessas populações podem desenvolver um temor justificado de perseguição, como no caso de diminuição de recursos e negação de acesso de maneira discriminatória, caracterizando perseguição baseada em um ou mais critérios da Convenção.

O Direito Internacional do Meio Ambiente evoluiu com regulamentações preventivas e sancionatórias relacionadas à deterioração do meio ambiente, enquanto o Direito Internacional dos Direitos Humanos, juntamente com o Direito Internacional Humanitário, lida com as consequências adversas da degradação ambiental sobre os seres humanos.

Porém, Refugiados Ambientais ainda é uma categoria que se encontra em um limbo normativo. Mas quem são eles?

 

2.     O conceito de Refugiados Ambientais (Climate Refugees)

"Refugiados Climáticos" ou “Refugiados Ambientais” é um termo comumente usado na mídia para descrever indivíduos forçados a deixar suas casas devido a eventos relacionados ao clima, mas não é uma categoria oficialmente reconhecida pelo direito internacional. Enquanto a maioria dos deslocamentos causados pelo clima ocorre dentro das fronteiras dos países, a Convenção de 1951 sobre Refugiados, que oferece proteção apenas a pessoas que fogem de guerra, violência, conflito ou perseguição e atravessam uma fronteira internacional em busca de segurança, não aborda diretamente essa situação. No entanto, em algumas circunstâncias, como quando o risco de perseguição ou violência é exacerbado pelas mudanças climáticas, os princípios da Convenção podem ser aplicados. Por exemplo, no Norte dos Camarões, em 2021, houve uma escalada de violência entre pastores e pescadores devido à escassez de água, que pode ser relacionada às mudanças climáticas, levando a deslocamentos em massa para países vizinhos como o Chade (UNHCR, 2023).

Leis regionais também podem oferecer proteção aos deslocados climáticos. Por exemplo, tanto a Convenção da Organização da Unidade Africana quanto a Declaração de Cartagena da América Latina incluem aqueles que buscam refúgio devido a eventos que perturbam gravemente a ordem pública, uma categoria que pode abranger eventos relacionados ao clima.

O mais recente relatório do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC, na sigla em inglês) afirma que as atividades humanas estão causando um aumento nos fatores que intensificam os impactos climáticos quentes, como o derretimento do permafrost, neve, geleiras e das camadas de gelo. Isso torna altamente improvável a viabilidade de manter o aquecimento global abaixo de 2°C. Essa situação tem implicações significativas para a saúde e a vida diária das pessoas, já que o aumento do nível do mar irá desregular as estações de enchentes, ampliar a erosão costeira, agravar a seca e as inundações, causar danos às habitações e interromper a agricultura (IPCC, 2022).

Uma dificuldade fundamental ao procurar soluções específicas é a falta de definição legal para pessoas que são obrigadas a se deslocar por motivos ambientais, e, consequentemente, de critérios que determinem se alguém se qualifica como tal. Para ajudar na interpretação e contribuir para as discussões internacionais sobre o assunto, o ACNUR emitiu, em 2020, um conjunto de considerações legais relacionadas a pedidos de proteção internacional produzidos no contexto dos efeitos adversos das mudanças climáticas e desastres naturais.

Desde 2008, mais de 318 milhões de pessoas foram obrigadas a se deslocar devido a desastres climáticos, o que é equivalente a uma pessoa sendo deslocada a cada segundo, ou toda a população da Austrália sendo forçada a sair de suas casas a cada ano (Banco Mundial, 2023). Somente no ano de 2020, cerca de 30,7 milhões de indivíduos foram deslocados devido a desastres ambientais, muitos dos quais estão diretamente relacionados às mudanças climáticas. Com as previsões apontando para um possível dobro desse número até 2050, de acordo com a Federação Internacional das Sociedades da Cruz Vermelha e do Crescente Vermelho (FICV), é vital abordar a questão do deslocamento de milhões de pessoas globalmente devido a esses desastres ambientais.

Desde 1994, a questão da migração internacional ligada ao desenvolvimento vem crescendo em importância na agenda global. A Agenda 2030 para o Desenvolvimento Sustentável das Nações Unidas inclui diversos objetivos relacionados à migração e enfatiza a importância de avaliar regularmente o progresso em direção a esses objetivos, utilizando dados que, em algumas situações, são divididos de acordo com o status migratório. Enquanto muitos conseguem encontrar refúgio dentro de seus próprios países, outros são forçados a buscar abrigo em nações estrangeiras. Esses movimentos tendem a aumentar à medida que as mudanças climáticas se intensificam. No entanto, a resposta a esse desafio tem sido, até agora, insuficiente, e a proteção oferecida às pessoas afetadas tem sido inadequada.

 

2.1.  O framework legal internacional do refúgio ambiental

A ausência de uma definição legal para descrever as pessoas que são compelidas a se deslocar devido a fatores ambientais é um problema de grande preocupação, uma vez que isso as coloca em uma situação jurídica incerta. Embora a maioria das pessoas deslocadas por eventos relacionados ao clima permaneça dentro das fronteiras de seus próprios países, algumas optam por buscar segurança em territórios estrangeiros e são então categorizadas como 'pessoas deslocadas externamente'.

No entanto, uma vez que a maior parte dos dados disponíveis se concentra nas pessoas que permanecem deslocadas dentro de seus próprios países, é difícil obter uma visão clara da escala da migração internacional resultante de desastres ambientais. Essa falta de dados também se deve, em parte, à ausência de um arcabouço legal que defina o status dos migrantes climáticos externos, o que impede a implementação de um conjunto de regras internacionais para abordar essa questão. Apesar disso, a comunidade global começou a reconhecer o fenômeno da migração climática externa.

Em 19 de setembro de 2016, a Assembleia Geral da ONU aprovou a Declaração de Nova York sobre Refugiados e Migrantes, na qual foi solicitado o desenvolvimento de dois pactos globais: um voltado aos refugiados e outro aos 'outros migrantes'. A elaboração dessa Declaração, também conhecida como "Declaração de Nova Iorque", ocorre em um cenário marcado por um aumento significativo e sem precedentes no número de pessoas deslocadas em todo o mundo, atingindo níveis alarmantes que não eram vistos desde a Segunda Guerra Mundial. Esses deslocamentos, tanto forçados quanto voluntários, estão se tornando cada vez mais complexos devido a uma variedade de fatores como conflitos, violência, crises econômicas e desastres ambientais, apresentando desafios adicionais para a comunidade global lidar com essa situação (Carvalho, 2018).

O segundo pacto, conhecido como Pacto Global para a Migração Segura, Ordenada e Regular (GCM), foi endossado em 10 de dezembro de 2018, em Marrocos, e reconhece, em seu segundo objetivo, a situação urgente dos migrantes que estão sendo deslocados devido às mudanças climáticas.

De acordo com a Comissão Europeia, no Debate do Parlamento Europeu sobre o pacto global para a migração (2018), o Pacto Global para Migrações Seguras, Ordenadas e Regulares é o primeiro marco de cooperação internacional não legalmente vinculativo no campo da migração, sendo resultado de amplas discussões e negociações entre todos os Estados membros das Nações Unidas (Comissão Europeia, 2018).

Esse pacto teve origem na Declaração de Nova Iorque, em 2016, aprovada por unanimidade na Assembleia Geral das Nações Unidas no mesmo ano, e tem como objetivo fomentar a cooperação internacional, estabelecendo princípios direcionadores e oferecendo um quadro político multilateral. Ele aborda a natureza complexa da migração internacional, tratando de uma ampla gama de questões relacionadas, como gestão de fronteiras, contrabando e tráfico de pessoas, documentação de migrantes, repatriação e readmissão, além de diásporas e remessas de fundos (Stylianides, 2018).

No mesmo ano, a 24ª Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (COP24) abordou a questão das pessoas sendo deslocadas por causa das mudanças climáticas (OIM, 2023).

Entretanto, apesar de a questão da migração climática ser agora um tema recorrente em fóruns internacionais, as pessoas diretamente afetadas por isso ainda não receberam nenhum status oficial ou proteção legal. Com base no relatório especial do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC) que abordou questões relacionadas às mudanças climáticas, desertificação, degradação da terra, gestão sustentável da terra, segurança alimentar e emissões de gases de efeito estufa em ecossistemas terrestres, a Conferência das Partes (COP25) de 2019 discutiu os desafios da desertificação e o estresse no sistema global de alimentos como consequências das mudanças climáticas, impactando a qualidade de vida humana (IPCC, 2022).

Segundo a Organização Internacional para as Migrações (OIM), as mudanças climáticas estão agravando a situação de grupos humanos já em vulnerabilidade e estimulando a sua movimentação. Os deslocamentos causados por desastres ligados ao clima já são reconhecidos, mas essa questão demanda soluções de longo prazo, enquanto, no curto prazo, os deslocados climáticos permanecem sem uma definição legal (OIM, 2021).

O Direito Internacional dos Refugiados (DIR), o Direito Internacional Humanitário (DIH) e o Direito Internacional dos Direitos Humanos (DIDH) são as três fontes de proteção internacional para os refugiados. O DIDH garante os direitos de todas as pessoas, sem distinção, em qualquer situação; o DIH estabelece regras a serem seguidas em casos de conflitos armados, sejam eles internos ou externos; e o DIR oferece proteção, tanto em tempos de paz quanto de guerra, para aqueles que sofrem perseguição e são forçados a migrar internacionalmente (Trindade et al., 1996).

Associando esses Direitos aos Refugiados Ambientais, dentro de cada uma das vertentes mencionadas, notamos que cada Direito age de uma maneira diferente, como veremos em seguida.

O Direito Internacional dos Direitos Humanos oferece proteção geral aos refugiados ambientais, sem se referir especificamente ao assunto. Os refugiados ambientais têm direito às normas dos Tratados Internacionais sobre o direito de se deslocar, bem como aos demais Direitos Humanos, universais ou particulares. Quanto às questões ambientais, é preciso levar em conta que as mudanças climáticas são somente um dos fatores ambientais que podem afetar esses direitos. emergências podem restringir a aplicação das normas de Direitos Humanos, seja por força da lei ou por falha das Políticas Públicas. Apesar das normas de Direitos Humanos serem de cumprimento imediato, o acesso a esses direitos, muitas vezes, depende do recurso aos Tribunais, nacionais e internacionais (Claro, 2020).

O Direito Internacional Humanitário é um ramo do Direito Internacional que regula o uso da força em situações de conflitos armados. Ele é formado pelos chamados “Direitos de Haia”, “Direito de Genebra”, “Direito de Nova Iorque” e o “Direito de Roma” (Borges, 2006). No entanto, devido ao grande número de pessoas afetadas por desastres ambientais, as entidades que promovem esse direito, principalmente o Comitê Internacional da Cruz Vermelha (CICV), e suas sociedades nacionais, têm oferecido ajuda humanitária aos que sofrem com esses desastres, mesmo que não estejam envolvidos em conflitos armados (Fernandes, 2006).

 Os refugiados ambientais não podem ser separados do DIH, pois fatores ambientais podem gerar conflitos armados, e já se comprovou que a falta de recursos naturais pode, de fato, aumentar as tensões sociais, econômicas e políticas, juntando-se às outras causas de conflitos (Homer-Dixon, 1994). Assim, se as previsões de crescimento de conflitos provocados pelas mudanças climáticas se confirmarem, a demanda pela aplicação das normas de DIH também será necessária, tanto na forma tradicional, relativa aos conflitos armados, quanto na perspectiva de proteção a pessoas em situação de desastres ambientais (Claro, 2020).

Por último, O DIR não inclui desastres ou outras causas ambientais como motivo para uma pessoa pedir refúgio, mas admite que o refugiado ambiental pode se enquadrar como um refugiado “tradicional”, se atender às condições da Convenção de 51, mesmo que o temor de perseguição tenha origem em um fator ambiental. O Comitê de Direitos Humanos da ONU, em 2019, reconheceu o efeito das mudanças climáticas em todos os direitos humanos, e declarou que os Estados não podem enviar de volta migrantes para países onde suas vidas possam estar em risco, mesmo que por fatores ambientais. A decisão, embora não tenha força obrigatória, é um precedente importante para a aplicação do princípio da não-devolução para os refugiados ambientais (Claro, 2020).

O Direito Internacional dos Refugiados é em grande parte definido pela Convenção das Nações Unidas de 1951 sobre o Estatuto dos Refugiados e pelo seu Protocolo de 1967 sobre o Estatuto dos Refugiados - juntos referidos como "a Convenção de 1951" (ONU, 1951; 1967). A Convenção de 1951 estipula quem é considerado um refugiado, quais são as proteções legais, assistência e direitos sociais aos quais os refugiados têm direito, e as obrigações que os refugiados têm para com os países que os acolhem. Eis que, de acordo com a Organização das Nações Unidas, refugiado é

uma pessoa que está fora de seu país de nacionalidade ou residência habitual; que tem um medo bem fundamentado de ser perseguida devido à sua raça, religião, nacionalidade, pertencimento a um determinado grupo social ou opinião política; e que é incapaz ou não está disposta a se beneficiar da proteção desse país, ou a retornar a ele, por medo de perseguição (ONU, 1951).

Infelizmente, essa definição não abrange a maioria das pessoas deslocadas devido às mudanças climáticas. A menos que saiam de áreas onde os efeitos das mudanças climáticas levaram à instabilidade (por exemplo, a escassez de alimentos provocando conflitos regionais), a maioria não preencherá os critérios para o status de refugiado, conforme definido pela Convenção de 1951, mesmo que aqueles que foram deslocados pelas mudanças climáticas possam ter perdido totalmente sua terra natal ou mesmo o país.

Sendo a única autoridade de abrangência global que define o status de refugiado, a Convenção de 1951 deixa de contemplar as pessoas deslocadas devido às mudanças climáticas e coloca a comunidade internacional em uma posição reativa para lidar com o deslocamento causado pelas mudanças climáticas, à medida que os efeitos mais devastadores do fenômeno ganham força.

Um dos primeiros estudos sobre a migração provocada por fatores ambientais foi um relatório do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA), publicado em 1985 (El-Hinnawi, 1985). No entanto, o termo “refugiados ambientais” não é adequado do ponto de vista do direito internacional, pois a Convenção de 1951 sobre o Estatuto dos Refugiados estabelece critérios específicos para que uma pessoa possa ser reconhecida como refugiada e venha a receber a proteção internacional correspondente. Esses critérios não incluem as pessoas deslocadas por razões ambientais, mesmo que se faça uma interpretação atualizada da Convenção (Miranda, 2010). O principal problema é que, na maioria dos casos, não há uma perseguição ou uma ação deliberada de um agente identificável ou do próprio Estado contra essas pessoas (Kozoll, 2004).

Embora essa perspectiva seja promissora para o deslocamento climático, a definição não aborda diretamente o status de "refugiado climático" e, mais importante, não estabelece as obrigações dos Estados em relação a esses refugiados ao conceder-lhes asilo, deixando essa questão a cargo das legislaturas de cada país. Sendo vinculativa apenas a nível regional, a definição inadequada do status de "refugiado climático" e a ausência de uma definição clara das responsabilidades dos Estados em relação a esses refugiados tornam a Convenção da OUA inadequada para proporcionar as proteções globais e o status que as pessoas deslocadas devido às mudanças climáticas tão urgentemente necessitam.

A Declaração de Cartagena, de 1984, busca lidar com "os fluxos massivos de refugiados na região da América Central", ampliando o conceito de refugiados. Nesse sentido, a Declaração de Cartagena recomenda que a definição de refugiado (conforme a Convenção de 1951) inclua "pessoas que deixaram seu país porque suas vidas, segurança ou liberdade foram ameaçadas por violência generalizada, agressão estrangeira, conflitos internos, graves violações de direitos humanos ou outras circunstâncias que tenham perturbado gravemente a ordem pública" (Jubilut; Apolinário, 2010).

Nesse sentido descrito pela Declaração de Cartagena de 1984, à medida que os impactos das mudanças climáticas se tornam mais severos, incluindo eventos climáticos extremos, é cada vez mais provável que essas mudanças provoquem situações que afetem seriamente a ordem pública. Isso é particularmente verdadeiro em estados costeiros e pequenos estados insulares em desenvolvimento, onde as comunidades urbanas e até nações inteiras enfrentam os efeitos devastadores das mudanças climáticas. Entre esses efeitos estão a elevação do nível do mar, ciclones tropicais mais fortes e inundações, que exacerbam problemas como inundações costeiras e deslocamento de populações. 

Dado que não existe um acordo global legalmente obrigatório para apoiar os refugiados climáticos, a necessidade de um tratado internacional se torna crucial. Um tratado internacional desse tipo, uma vez estabelecido, assinado e ratificado, teria alcance global e imporia as proteções tão urgentemente necessárias.

Nos próximos anos, as mudanças climáticas devem deslocar milhões de pessoas (Banco Mundial, 2023). Embora possamos reduzir a escala geral das mudanças climáticas e o deslocamento resultante por meio de ações decisivas, é essencial que a comunidade internacional estabeleça um novo tratado que defina o status, as obrigações e os deveres em relação aos refugiados climáticos antes que os efeitos do deslocamento aumentem de forma exponencial.

Quando centenas de milhões de vidas estão em jogo, bem como bilhões ou até mesmo trilhões de dólares, é fundamental que o mundo adote uma postura proativa em relação a essa questão, a fim de elaborar um plano para enfrentar a iminente crise humanitária do deslocamento causado pelas mudanças climáticas.

 

3.               O futuro da migração climática e refugiados ambientais

Em 2022, foram registrados aproximadamente 61 milhões de pessoas obrigadas a se mudar, apresentando um aumento de 60% em relação ao ano anterior e se estabelecendo como um número recorde de deslocamentos internos, de acordo com o Centro de Monitoramento de Deslocamentos Internos (Internal Displacement Monitoring Centre- IDMC, 2023). Neste caso, conflito e violência motivaram deslocamentos de 28.3 milhões de pessoas, sendo 60% destes relacionados à Guerra na Ucrânia. Só no Paquistão, extremas enchentes obrigaram estimadas 33 milhões de pessoas a atravessarem as fronteiras do país, enquanto que, destas, 8.2 milhões fizeram esse movimento internamente (IOM, 2022).

A cada ano, desastres ambientais e climáticos empurram indivíduos à mobilização, e o número tende a crescer, visto que a frequência, duração e intensidade desses eventos climáticos irão aumentar cada vez mais, acompanhando as mudanças climáticas pelas quais o Planeta vem passando. De acordo com o Banco Mundial (2021), a projeção é de que, até 2050, o mundo testemunhará o deslocamento de mais de 200 milhões de refugiados ambientais, caso ações calculadas e eficientes não sejam empenhadas para mitigar os efeitos climáticos.

Em seu relatório recente, de 2021, o Banco Mundial trouxe informações alarmantes sobre como as mudanças climáticas estão moldando as migrações globais e sobre a necessidade de uma ação coletiva para minimizar seus impactos. O citado Relatório Groundswell, do Banco Mundial, aponta que as mudanças climáticas estão se tornando um impulsionador cada vez mais potente da migração, com potencial de obrigar cerca de 216 milhões de pessoas, espalhadas por seis regiões globais, a se deslocarem internamente em seus países até 2050. É possível que áreas críticas de migração climática interna comecem a surgir já em 2030 e que continuem a se espalhar e agravar até 2050. O Relatório também enfatiza que ações imediatas e coordenadas para reduzir as emissões globais, além de apoiar um desenvolvimento sustentável, inclusivo e ecologicamente correto, poderiam diminuir em até 80% a magnitude da migração devido às mudanças climáticas (Banco Mundial, 2021).

As mudanças climáticas exercem uma influência significativa na migração interna, principalmente devido aos impactos que causam nos meios de subsistência das pessoas e à perda de habitabilidade em áreas altamente afetadas. Até 2050, espera-se que a África Subsaariana tenha até 86 milhões de migrantes internos devido ao clima; o Leste Asiático e o Pacífico, 49 milhões; o Sul da Ásia, 40 milhões; o Norte da África, 19 milhões; a América Latina, 17 milhões; e o Leste Europeu e a Ásia Central, 5 milhões (Banco Mundial, 2021).

Em seu Relatório, o Banco Mundial prevê que muitas áreas urbanas e periurbanas precisarão se preparar para a chegada de muitos pessoas, o que envolve melhorias na infraestrutura habitacional e de transporte, nos serviços sociais e nas oportunidades de emprego. Sendo bem planejada, a "imigração interna" pode gerar um impacto positivo, especialmente em áreas urbanas, que podem se beneficiar da concentração populacional e das economias de escala.

Além disso, a importância de estratégias de desenvolvimento que auxiliem as pessoas a se adaptarem localmente ou a "permanecerem onde estão", em áreas onde isso seja viável, é evidente. Componentes bem-sucedidos dessas estratégias de adaptação local incluem investimentos em infraestrutura adaptada ao clima, diversificação das fontes de renda, estabelecimento de sistemas de proteção financeira mais ágeis para grupos vulneráveis e o empoderamento das mulheres por meio da educação. Programas de redução da pobreza e de proteção social focados em áreas rurais podem contribuir para o fortalecimento da capacidade de adaptação às mudanças climáticas, potencialmente reduzindo a necessidade de migração forçada (Banco Mundial, 2021).

Para finalizar, o Relatório Groundswell de 2021 sugere que algumas ações podem contribuir para a diminuição dos impactos das mudanças climáticas sobre a migração forçada, reduzindo em até 80% as previsões sobre o número de refugiados ambientais, destacando-se a redução imediata da emissão de gases de efeito estufa – gases atmosféricos que contribuem para o efeito estufa e o aquecimento global. É crucial implementar ações globais efetivas para alcançar a meta do Acordo de Paris de limitar o aumento da temperatura global a menos de 2°C até o final deste século. Emissões mais elevadas de gases do efeito estufa têm o potencial de causar sérias perturbações nos meios de subsistência e nos ecossistemas, criando assim as condições para um aumento significativo na migração induzida pelo clima.

Outra ação apontada pelo Relatório é incorporar a migração climática no planejamento do desenvolvimento urbano, considerando que a maioria das regiões possui leis, políticas e estratégias pouco preparadas para lidar com pessoas que se deslocam de áreas de risco climático crescente para áreas que já podem estar densamente povoadas.

Logo, é necessário incorporar a migração climática às políticas públicas. Para garantir a resiliência e perspectivas de desenvolvimento a todos os afetados, ações são necessárias em todas as etapas da migração (antes, durante e após a mudança). Nesse contexto, o envolvimento de atores privados, sociedade civil e organizações internacionais desempenha um papel fundamental na construção de estruturas políticas e na capacitação destes atores.

Por fim, o Relatório sugere que é necessário aumentar os investimentos para uma melhor contextualização e compreensão da migração climática, especialmente em escalas que vão desde a regional até a local, onde os impactos climáticos podem diferir das tendências mais amplas, identificadas em análises de escala global. Em muitos casos, há disponibilidade de um conjunto mais abrangente e detalhado de indicadores climáticos, biofísicos, socioeconômicos e políticos em níveis regionais, nacionais e locais.

 

3.1.  O papel da Organização das Nações Unidas (ONU)

Nos anos 70, com o surgimento do termo "refugiados ambientais”, as opiniões divergentes sobre como descrever esse fenômeno dividiam-se em duas correntes distintas: aqueles mais alarmistas, que consideravam o ambiente como a causa primordial dos deslocamentos populacionais e previam que centenas de milhões de pessoas seriam afetadas; e os céticos, que levantavam questionamentos em relação aos modelos simplificados utilizados para produzir essas estimativas (Martin, 2010). Até 2050, a previsão mais utilizada, reproduzida em relatórios de organismos internacionais, como o Banco Mundial e a ACNUR, é a de que 200 milhões de pessoas serão obrigadas a se deslocar devido às mudanças climáticas.

Conforme os registros do ACNUR, uma quantidade sem precedentes de 65,6 milhões de pessoas, em todas as partes do mundo, foram obrigadas a abandonar seus lares. Entre elas, aproximadamente 22,5 milhões são consideradas refugiadas, com mais da metade desses indivíduos tendo menos de 18 anos de idade. Além desse contingente, existe um grupo de 10 milhões de pessoas sem nacionalidade, enfrentando a negação de direitos fundamentais como acesso à educação, cuidados de saúde, oportunidades de trabalho e a própria liberdade de deslocamento (ACNUR, 2017).

São identificados cinco cenários relacionados às mudanças climáticas que podem causar deslocamento humano de forma direta ou indireta. Esses cenários constituem um ponto de partida valioso para analisar a natureza do deslocamento e avaliar as necessidades de proteção e assistência das pessoas afetadas: (1) aqueles relacionados à agua e fenômenos meteorológicos, como enchentes, furacões, deslizamentos etc.; (2) zonas consideradas como potencialmente vulneráveis e perigosas para habitação humana; (3) degradação ambiental e desastres de evolução lenta; (4) ilhas pequenas que estão afundando; (5) conflitos violentos cujo gatilho é a falta de recursos essenciais, como água, terra e comida, decorrente de mudanças climáticas (Kalim et al., 2013).

Atualmente, o maior problema da categoria de Refugiados Climáticos é a falta de legislação internacional reconhecendo legalmente tal categoria. O fato é que não existem arcabouços legais, convenções, protocolos, acordos e documentos que definam como a proteção e assistência às pessoas deslocadas por desastres ambientais deve se dar. Apesar de se conseguir adaptar alguns aspectos de Direito Internacional Humanitário, o mesmo não se aplica em termos de direitos e ajuda humanitária quando se trata de Refugiados Climáticos (Ozcan et al., 2018).

Conforme a Convenção sobre Refugiados, as alterações no ambiente não podem ser imputadas como causa quando seres humanos são motivados a se deslocar devido às mudanças ambientais. Além disso, os refugiados são indivíduos que atravessaram fronteiras internacionais, porém, na maioria dos casos, é provável que pessoas deslocadas devido a fatores ambientais sejam consideradas Pessoas Deslocadas Internamente, pelo menos inicialmente.

Ademais, os governos que aderem à Convenção de Refugiados concordam em garantir proteção e assistência aos indivíduos reconhecidos como refugiados. Esse suporte está vinculado a recursos e financiamento, o que gera preocupações quanto à diluição desses recursos caso seja concedido a um número maior de pessoas (considerando, inclusive, migrantes afetados por questões ambientais) o status de refugiado (Strauss et al., 2018).

No relatório Refugiados Climáticos - Respostas Legais e Políticas para a Migração Ambiental, do Parlamento Europeu (2011), aponta-se que o processo da mudança climática reflete diretamente nos movimentos populacionais de duas maneiras: (1) deslocamento permanente e; (2) deslocamento temporário. Migração decorrente de tornados, enchentes, terremotos, tsunamis ou ondas gigantes pode ser definida como um deslocamento temporário, feito de maneira rápida, urgente e forçosamente. Já o deslocamento permanente pode ser explicado no caso da resposta ao desastre se mostrar lenta e ineficiente, não dando muitas opções para as populações afetadas senão o deslocamento para outras áreas, sem possibilidade de retorno (Kraler et al., 2011).

Nas migrações ambientais, tanto temporárias quanto permanentes, incluindo aquelas causadas por mudanças climáticas, as pessoas têm a possibilidade de escapar para fronteiras internacionais (às vezes, além das suas fronteiras) e de buscar abrigo em locais seguros dentro do próprio país onde vivem. Quando permanecem em lugares seguros dentro dos limites de seus próprios países ou estados, o seu status sob a lei internacional de refugiados passa a ser o de Pessoas Deslocadas Internamente (PDIs).

Pessoas que foram forçadas a se mudar de suas regiões de origem chamam a atenção do Alto Comissariado das Nações Unidas para Refugiados (ACNUR) e, ao menos, têm a possibilidade de contar com uma forma básica de proteção internacional. No entanto, nota-se que esses indivíduos não possuem uma definição legal clara quando ocorrem deslocamentos significativos nas fronteiras internacionais devido a eventos ambientais extremos, ou quando esse movimento ultrapassa as linhas divisórias entre nações.

Os relatórios da UNFCCC e do IPCC têm um papel central nas discussões de políticas sobre mudanças climáticas, e seus princípios ou sugestões desempenham um papel desproporcional em estabelecer parâmetros para ação internacional. Dentro dessa perspectiva, uma nova convenção proposta dentro do âmbito das Nações Unidas deveria abranger uma ampla gama de direitos e obrigações, combinada com um mecanismo de implementação, além de incorporar elementos relacionados às causas fundamentais do deslocamento.

A comunidade internacional tem a responsabilidade de abordar os refugiados climáticos dentro do escopo da proteção internacional, bem como de cumprir com suas obrigações, tais o compartilhamento de encargos e a assistência. Enquanto o ACNUR reconhece a degradação ambiental e as alterações climáticas como fatores que podem resultar em migrações entre fronteiras, o mesmo não as considera como fundamentos para conceder o status de refugiado de acordo com o Direito Internacional, o que resulta em um problema internacional.

Na atualidade, a classificação de "refugiado climático" adota uma visão relativamente estática das relações entre clima e sociedade. A criação de um quadro legal específico para um novo contrato ou tratado de refugiados com base em fatores ambientais não parece ser uma tarefa simples neste momento. Contudo, a estrutura legal e institucional do sistema existente pode ser desenvolvida sob a égide das Nações Unidas.

O sistema atual necessita de uma reavaliação a qual aborde diversos aspectos críticos. Primeiramente, é essencial ampliar o conceito de "pessoas deslocadas internamente". Além disso, a Convenção de 1951 precisa ser reconfigurada no contexto das mudanças climáticas, e um mecanismo de proteção temporária deve ser estabelecido, pelo menos, para os refugiados climáticos. A avaliação da Convenção de Direitos Humanos em relação aos refugiados climáticos é crucial, assim como a criação de um framework para soluções de reassentamento e a minimização das vulnerabilidades das populações afetadas (Banco Mundial, 2023).

Nesse cenário, os refugiados climáticos também demandam uma abordagem distinta no contexto dos compromissos da nova agenda urbana. Questões essenciais surgem no planejamento urbano relacionado às mudanças climáticas, incluindo a necessidade de considerar os refugiados climáticos como beneficiários de novos Direitos Urbanos e Ambientais. A integração desses refugiados como novos membros da sociedade que os acolhe é fundamental, assim como lidar com o crescimento populacional inesperado e com os desafios de infraestrutura nas cidades (Banco Mundial, 2023).

 

4.               Impacto das mudanças climáticas nas políticas públicas

Em relatório lançado em 2019, o International Monetary Fund (FMI) afirma que desastres naturais causam um grande impacto humano e interrompem a atividade econômica em muitos países em desenvolvimento, especialmente em pequenos Estados. Desastres relacionados ao clima, como furacões/ciclones e secas, têm aumentado em intensidade e frequência ao longo do tempo em meio às mudanças climáticas globais, enquanto eventos geológicos, como erupções vulcânicas, terremotos e tsunamis, representam um perigo constante.

Numerosas economias em desenvolvimento, mesmo aquelas que não são pequenos estados, enfrentam uma grande vulnerabilidade a desastres naturais, que incluem terremotos, enchentes e desastres de evolução lenta, como secas. Por exemplo, países de baixa renda na África Subsaariana, que dependem principalmente da agricultura de sequeiro, sofrem danos significativos devido a secas e enchentes recorrentes. O recente desastre causado por ciclones em Moçambique é um exemplo ilustrativo dessa situação. Além disso, nações em desenvolvimento no Oriente Médio e na Ásia Central estão sujeitas a secas, enchentes e terremotos.

Essas vulnerabilidades climáticas agravam os desafios relacionados a conflitos em certos países, como Afeganistão e Somália. Na região da Ásia-Pacífico, há uma alta exposição a desastres naturais, incluindo ciclones, terremotos, tsunamis e atividade vulcânica, com o Sul da Ásia e as Filipinas sendo algumas das áreas mais gravemente afetadas (IMF, 2019).

Diante disso, o citado relatório do FMI sugere que políticas públicas de resiliência climática sejam implementadas, através de medidas que incrementem resiliência estrutural, financeira e pós-desastre. Melhorar a resiliência estrutural envolve investimentos adequadamente escolhidos e priorizados que limitam o impacto de desastres; garantir a resiliência financeira envolve o uso de reservas fiscais e instrumentos financeiros preestabelecidos para gerenciar os custos de recuperação após um desastre; e a resiliência pós-desastre requer um planejamento de contingência para apoiar uma resposta rápida às necessidades públicas na sequência de um desastre (IMF, 2019).

No caso de Refugiados Ambientais, que já precisaram se deslocar, tanto interna quanto internacionalmente, é importante pensar em políticas públicas de acolhimento, e sobre como esses indivíduos podem ser integrados às novas sociedades, de maneira que os Estados de acolhimento, através da Governança multinível e via governo e sociedade civil, facilitem a inclusão social e adaptação satisfatória desse contingente de pessoas.

Além da questão de moradia, também é preciso lembrar que cada uma dessas pessoas tem um potencial e habilidades que poderiam ser aproveitados nos Estados acolhedores, dando oportunidade e dignidade para que o refugiado retome sua vida e sua dignidade. No caso de “strong matches”, esses migrantes forçados podem trazer os mesmos benefícios dos migrantes voluntários à sociedade de destino, mesmo que a razão de seu deslocamento tenha sido o medo, e não a busca de oportunidades (Banco Mundial, 2023).

Já aqueles que possuem “weak match” podem ser refugiados que escolhem seu destino baseados na necessidade imediata de segurança, não de trabalho. Mesmo assim, sob as leis internacionais, eles devem ser acomodados, independentemente do quanto isso custe aos Estados acolhedores, que devem buscar reduzir esses custos e dividi-los com a comunidade internacional (Banco Mundial, 2023).

 

4.1. Os desafios para as políticas públicas: Possibilidades de adaptações de políticas públicas existentes, caso housing first da Finlândia

A implementação de políticas públicas eficazes é essencial para garantir a proteção dos direitos das populações afetadas por desastres climáticos. os refugiados climáticos devem ser considerados na nova agenda urbana como beneficiários de novos direitos urbanos e ambientais, o que implica abordar questões como planejamento urbano, crescimento populacional e infraestrutura nas cidades para garantir sua integração adequada. Dada a natureza global do fenômeno dos refugiados climáticos, uma resposta coordenada em nível internacional é fundamental.

Todavia, com algumas adaptações, experiências de políticas públicas destinadas às populações vulneráveis, que tenham tido sucesso, podem ser utilizadas como bons exemplos para o acolhimento refugiados. Para isso, podemos ter como exemplo o caso da política pública aplicada na Finlândia às populações de rua, ainda que em um universo pequeno e com as caraterísticas próprias daquele país, mas que podem ser adaptadas para a recepção de refugiados, quando as situações de desastres já não puderem ser evitadas.

Em 2008, o Governo da Finlândia resolveu implementar um programa nacional para erradicar a situação de rua no país, mirando em pessoas sem-teto há muito tempo (acima de um ano ou voltando de maneira recorrente às ruas nos últimos três anos, apresentando sérios problemas sociais e de saúde). O público-alvo consistia, principalmente, do grupo mais vulnerável de pessoas, aquelas que se acomodavam em abrigos e hostels, ou dormindo nas ruas (Tumen, 2021).

No final de 2016, a Finlândia registrou 6.785 pessoas em situação de falta de moradia e 424 famílias sem um lar adequado, de acordo com dados do Centro de Financiamento e Desenvolvimento Habitacional da Finlândia (ARA - sigla em finlandês). É importante destacar que mais de 80% dessas pessoas sem-teto estavam temporariamente abrigadas com familiares ou amigos, o que significa que não estavam vivendo nas ruas ou em abrigos noturnos. Atualmente, a Finlândia praticamente não possui pessoas em situação de rua, graças às medidas adotadas para abordar essa questão (Soilikki, 2017).

O diferencial do Programa Housing First, porém, recai sobre a filosofia de fornecer, antes de qualquer coisa, a moradia, provendo, incondicionalmente, indivíduos com a independência do seu próprio espaço, através de um contrato de aluguel e o suporte necessário, sempre que desejar. Através desse Programa, deu-se início a um processo de renovação e transformação dos abrigos existentes e hostels em moradias de apoio no modelo Housing First.

Basicamente, o Programa consiste de seis passos: i) a nível de políticas públicas, o consenso político geral da importância de lidar com a situação de rua, de maneira radical, foi essencial para atingir o objetivo: todos os governos, independentemente de partidos e coalizões, concordaram em implementar o Housing First como uma política nacional, com recursos financeiros suficientes para sua implantação; ii) a implementação do programa contou com vários atores sociais, autoridades, ministérios, cidades e Organizações não Governamentais, tanto em âmbito local quanto nacional; iii) o Programa foi aplicado baseado em contratos entre o Estado e as grandes cidades, fornecendo um objetivo em comum e um plano prático de execução, com impacto direto no fornecimento de serviços; iv) apesar de, hoje em dia, o Programa Housing First aparecer como um programa de Governo pela primeira vez, o papel do Estado é,  ao bem da verdade, superficial, e não existe uma coordenação ou liderança nacionais. A responsabilidade foi transferida aos Municípios, que seguem implementando e desenvolvendo o Programa, de acordo com seus próprios planos, de maneira independente; v) a nível de serviço, a renovação e conversão de abrigos e hostels em moradia auxiliar, com flats individuais, teve um profundo impacto na situação de pessoas em rua e nos serviços relacionados: houve um quase absoluto desaparecimento de acomodações temporárias tradicionais; vi) todas as unidades encontram-se em locais de bom nível, com serviços regulares ao redor e perto do transporte público, mostrando que, para reabilitar pessoas, é importante estabelecer um senso de comunidade através do nível dos serviços oferecidos ordinariamente, o que fornece um apoio tão importante quanto a acomodação em si (Tumen, 2021).

A abordagem revolucionária do Housing First está centrada na premissa de conceder dignidade, respeito e recursos fundamentais para a reconstrução e reestruturação de indivíduos, começando pelo direito básico à habitação. A partir desse alicerce, os beneficiários podem atender às suas necessidades de saúde mental, higiene pessoal e preparação para ingressar no mercado de trabalho, a fim de sustentar sua moradia e iniciar um novo capítulo em suas vidas. Ao adotar essa filosofia, o Housing First rompe com a tradição de programas que condicionam o acesso à moradia a critérios de mérito, ignorando os desafios enfrentados por pessoas em situação de rua ao tentarem reconstruir suas vidas. O Housing First subverte essa lógica e exemplifica como os princípios de Inovação Social e Empreendedorismo Social podem ser poderosos, transformando questões sociais prementes em casos de sucesso inspiradores.

O caso da Finlândia destaca o sucesso do modelo Housing First na abordagem da situação de rua, que poderia, com igual sucesso, se adaptar à crise habitacional de refugiados. A ênfase na dignidade humana e no fornecimento de moradia como primeiro passo para a reintegração social demonstra a eficácia de abordagens inovadoras e centradas nas necessidades das pessoas. A combinação de empreendedorismo social e inovação social desempenha um papel essencial na transformação de questões sociais prementes em casos de sucesso inspiradores.

 

Conclusões

Ao longo deste estudo, fez-se evidente o fato de que as mudanças climáticas estão se tornando mais frequentes, imprevisíveis e drásticas, impactando diretamente a habitabilidade de determinadas regiões e exacerbando a mobilidade humana. Destacou-se a necessidade urgente de Políticas Públicas eficazes de mitigação e resiliência para lidar com esses desafios, reconhecendo que os refugiados ambientais serão uma realidade cada vez mais comum.

As políticas públicas enfrentam desafios significativos na preparação das cidades para mudanças climáticas e no acolhimento de refugiados ambientais. A adaptação às mudanças climáticas desempenha um papel crucial na proteção das pessoas contra os efeitos adversos, como temperaturas elevadas, aumento do nível do mar e tempestades mais intensas. Populações em situação de pobreza são especialmente suscetíveis a essas consequências, e os Estados insulares ou cidades abaixo do nível do mar, assim como Estados em desenvolvimento, enfrentam vulnerabilidades significativas em relação a tempestades e aumento do nível do mar.

Os custos para a adaptação em países em desenvolvimento são estimados em bilhões de dólares anuais, mas os fundos internacionais para o clima direcionam apenas uma pequena parcela para iniciativas de adaptação. Investimentos em sistemas de alerta precoce, infraestrutura resistente ao clima e práticas agrícolas adaptativas poderiam resultar em economias significativas e benefícios sociais e ambientais.

No que diz respeito aos refugiados ambientais, é necessário desenvolver Políticas Públicas eficazes de acolhimento e integração. Os Estados acolhedores devem implementar medidas para facilitar a inclusão social e a adaptação dessas pessoas, reconhecendo seu potencial e habilidades. Isso pode incluir programas de moradia, emprego, educação e assistência.

O processo de formulação e implementação de Políticas Públicas é um desafio complexo e dinâmico, sujeito a diversas influências e variáveis. A flexibilidade inerente a esse processo reflete a natureza multifacetada das questões públicas e a necessidade de abordagens adaptativas para enfrentá-las. Essa reflexão contínua sobre o ciclo de Políticas Públicas é essencial para aprimorar a capacidade dos governos de responderem às demandas da sociedade de forma eficaz e equitativa. A busca por uma abordagem mais integrada e colaborativa na formulação e implementação de Políticas Públicas pode contribuir para o fortalecimento das instituições democráticas e para o alcance de resultados positivos para o bem-estar coletivo.

Em última análise, reconhecer a complexidade e a interconexão entre os diferentes estágios do processo de Políticas Públicas é essencial para desenvolver soluções mais efetivas e sustentáveis para os desafios enfrentados pelas sociedades contemporâneas.

É crucial estabelecer mecanismos de cooperação internacional para compartilhar responsabilidades e recursos entre os Estados acolhedores. A solidariedade global é fundamental para enfrentar os desafios relacionados às mudanças climáticas e aos refugiados ambientais, garantindo que ninguém seja deixado para trás.

 

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World Bank. (2023). World Development Report 2023: Migrants, Refugees, and Societies. Washington, DC: The World Bank.



[1] Identificador persistente ARK: https://id.caicyt.gov.ar/ark:/s25250841/fghhpbw6r

 

Fecha de recepción: 27/11/2024. Fecha de aceptación: 15/01/2025.

 

[2] Fundação Getúlio Vargas

Brasília, Brasil

https://orcid.org/0000-0003-1018-6438

artigosfgv.eppg@gmail.com

 

[3] Escola de Políticas Públicas e Governo da Fundação Getúlio Vargas (FGV/EPPG)

Brasília, Brasil

https://orcid.org/0009-0000-5361-0142

amendesmascarenhas@gmail.com